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Lendas e Mitos II – mais um passo na Evolução

Continuando na senda da interpretação dos 12 Trabalhos de Hércules e tendo a minha perspectiva pessoal sido apresentada no artigo anterior, continuo esta análise usando os mesmos princípios: a perspectiva mitológica, a descrição do Trabalho e a simbologia que lhe está associada.

Estou em crer que se conseguirmos analisar cada um destes Trabalhos à luz do nosso interior, seremos capazes de nos identificar e nele encontrar algumas respostas mas o Caminho Evolutivo só se fará se nos assumirmos com os nossos defeitos e virtudes e lutarmos internamente para sermos um Ser Humano mais completo a cada passo que damos, a cada experiência que temos.

Perspectiva mitológica:

Estas eram tarefas que só poderiam ser realizadas por alguém com força sobre-humana, como enfrentar uma serpente de várias cabeças. Na mitologia greco-romana, Hércules era filho de uma mortal com Zeus, o chefe dos deuses, era portanto considerado um semi-Deus. O seu nascimento provocou a ira de Hera, a esposa oficial de Zeus, que mandou duas serpentes matar o recém-nascido. Este, porém, sem grande esforço, estrangulou as cobras, mostrando desde cedo possuir uma força descomunal. Hércules cresceu, mas Hera continuou a persegui-lo e usou os seus poderes para provocar um acesso de loucura no herói, que acabou por matar a própria esposa e os filhos. Quando Hércules recuperou a razão, procurou o Oráculo de Delfos – o mais famoso templo de consulta às divindades gregas – para buscar orientação sobre como enfrentar a tragédia.

O Oráculo mandou-o entregar-se em servidão a Euristeus, rei da cidade de Micenas, e ordenou a realização das 12 famosas tarefas. Os 12 Trabalhos foram então realizados para que Hércules se redimisse das mortes que cometera e, também, para elevá-lo à condição divina no fim da sua jornada.

Segundo Trabalho – A Hydra de Lerna

Conta a lenda que na antiga terra de Argos ocorreu uma seca. Amímona que reinava nessas terras, procurou a ajuda de Neptuno. Este recomendou que se batesse numa rocha, e quando isso foi feito, começaram a brotar três correntes cristalinas; mas logo uma Hydra fez ali a sua morada.

O mestre disse a Hércules: “Para além do Rio Amímona, fica o fétido pântano de Lerna, onde está a Hydra, uma praga para as redondezas. “Nove cabeças tem esta criatura, e uma delas é imortal. Prepara-te para lutar com essa asquerosa fera e não penses que os meios comuns serão de valia; se uma cabeça for destruída, duas aparecerão em seu lugar.”

Hydra era filha dos monstros Tifão e Equidna. Eles habitavam um pântano junto ao Lago de Lerna na costa leste do Peloponeso. Hydra era um monstro com corpo de dragão e nove cabeças.

Hércules estava ansioso e antes de partir, seu Mestre ainda lhe disse: “Só te posso dar uma palavra de aconselhamento: Nós nos elevamos, nos ajoelhando; conquistamos, nos rendendo; ganhamos, dando. Vai, oh filho de Deus e filho do homem, e conquista.”

Chegando ao estagnado pântano de Lerna, que era um charco que desanimava quem dele se aproximasse e cujo mau cheiro poluía toda a atmosfera em um raio de sete milhas, Hércules teve que fazer uma pausa pois o simples odor por pouco o derrotava. As areias movediças eram uma ameaça e mais uma vez Hércules rapidamente retirou seu pé para não ser sugado para dentro da terra que cedia. Finalmente descobriu onde se ocultava a Hydra.

Numa caverna de noite perpétua vivia a fera, porém não se mostrava e Hércules inutilmente vigiava. Recorrendo a um estratagema, ele embebeu suas setas em piche ardente e despejou-as directamente para o interior da caverna onde habitava a horrenda fera. Seguiu-se uma enorme agitação e a Hydra com as suas nove e zangadas cabeças emergiu, chicoteando a água e a lama furiosamente. Com três braças de altura, era algo tão feio como se tivesse sido feito de todos os piores pensamentos concebidos desde o começo dos tempos. A Hydra atacou, procurando envolver os pés de Hércules que saltou e lhe deu um golpe tão severo que logo decepou uma das cabeças, mas mal a horrorosa cabeça tocou o solo, duas cresceram em seu lugar. Repetidamente Hércules atacou o monstro, mas ele ficava cada vez mais forte. Então Hércules lembrou-se das palavras do Mestre: “nós nos levantamos ajoelhando”.

Pondo de lado a sua clava, Hércules ajoelhou-se, agarrou a Hydra com as suas mãos nuas e ergueu-a. Suspensa no ar, a sua força diminuiu. De joelhos, então, ele sustentou a Hydra no alto, acima dele, para que o ar purificado e a luz pudessem surtir o seu efeito. O monstro, forte na escuridão e no lodo, logo perdeu a sua força quando os raios de sol e o toque do vento o atingiram. As nove cabeças caíram, mas somente quando elas jaziam sem vida Hércules percebeu qual era a cabeça mística que era imortal. Ele decepou essa cabeça e enterrou-a, ainda sibilante, sob uma rocha.

Reza a lenda que para terminar este Trabalho, Hércules teve a preciosa ajuda do seu sobrinho Iolau. Por cada cabeça cortada a Hydra, Iolau cauterizava-a com um tição certificando-se que dela não nasceriam duas novas cabeças. O monstro foi criado por Hera e o seu objectivo era matar Hércules mas quando se apercebeu que tal não seria possível, Hera enviou como ajuda um enorme caranguejo que Hércules espezinhou tornando-o na Constelação de Caranguejo (Câncer). Instruído por Atena (Minerva), Hércules após matar a Hydra banhou as suas flechas no sangue do monstro para as tornar venenosas. Euristeu por seu lado, não considerou este Trabalho válido (Hércules deveria cumprir 12 Trabalhos e não 11) visto que teve a ajuda do sobrinho Iolau.

Simbologia

Hércules foi incumbido de Doze Trabalhos, dentre eles, matar a Hydra, o monstro de nove cabeças que trazia pânico à cidade de Lerna. Mas antes de enfrentar o monstro, Hércules recebe uma mensagem de seu mentor: – ” É ajoelhando que nos levantamos; é nos rendendo que conquistamos; é desistindo de algo que o ganhamos”.

Hércules parte em busca do monstro que se esconde numa caverna escura, de noite perpétua, à margem de um pântano de águas estagnadas; e simboliza uma parte de nós que permanece oculta e resiste à iluminação.

Representa o nosso interior ruim, nossas paixões e defeitos, ambições e vícios, o que existe de ruim dentro do nosso mundo interior. Enquanto a Hydra, que representa esse monstro interior, não for dominada, enquanto as nossas vaidades, futilidades e ostentações não forem dominadas, as cabeças continuam crescendo cada vez mais.

Hércules chega ao covil da Hydra e atira flechas flamejantes ao esconderijo do monstro. Indignada, Hydra emerge do seu covil com ímpeto vingativo – da mesma forma, também nos sentimos assim quando certas situações nos obrigam a confrontar a besta que existe em nós ou a besta que existe nas pessoas à nossa volta.

Hércules tenta esmagar as cabeças de Hydra mas cada vez que corta uma cabeça outras surgem – da mesma forma quando tentamos destruir nossas emoções bestiais, elas continuam a aparecer. Finalmente Hércules lembra-se da mensagem do seu mentor: “é se ajoelhando que nos levantamos”.

Hércules ajoelha-se no pântano e levanta o monstro à luz do dia e ela perde seu poder. Então ele corta-lhe as cabeças que não nascem mais. Porém nada disso acontece, senão enfrentarmos o lado bestial que vive em todos nós.

A Hidra polifacéfala representa a mente e seus defeitos psicológicos. Quando ambicionamos subir à Morada dos Arcanjos – o Plano Mental Superior – primeiro devemos descer aos infernos de Mercúrio.

Como diz o mito, sempre que Hércules cortava uma das cabeças da Hydra, ela voltava a brotar, tornando a tarefa impossível. Assim como Arjuna é auxiliado por Krishna, também Hércules é auxiliado por Iolau – que aconselha Hércules a queimar as cabeças após cortá-las para não renascerem. Isso quer dizer que não basta compreender um defeito; é preciso ir além e capturar o profundo significado do mesmo; de contrário, eles voltam a nascer.

Os defeitos psicológicos eliminados nos infernos da Lua, o Astral Inferior, certamente possuem ramificações nos mais diversos níveis mentais. Eliminar as cabeças da Hydra da Mente é possível quando, após decepá-las forem cauterizadas com o fogo da alquimia sexual. Portanto, compreendido um defeito, deve-se durante o acto alquímico suplicar à Divina Mãe que o elimine até às suas raízes mais profundas.

Ao analisarmos este Trabalho, podemos concluir que só mascarar as nossas falhas, o nosso lado de ostentação, a ira que emerge das frustrações de não conseguirmos atingir os nossos objectivos ou de não sabermos lidar com algumas situações ou pessoas com que nos deparamos, não as faz desaparecer. Temos que levar a cabo um trabalho profundo e intrincado para que nos seja possível eliminar de vez esse lado mais sombrio que todos temos embora uns de forma mais explicita que outros. Enquanto nos negarmos a aceitar a nossa dimensão humana e não usarmos o orgulho como algo positivo, orgulho nas nossas raízes, na nossa história pessoal ou como povo e não como um sentimento negativo que nos leva por vezes a não olhar a meios para atingir os fins para satisfação das nossas futilidades, não vamos conseguir continuar o Caminho. Sentimentos como a ira desmedida, a ganância, a necessidade de nos mostrarmos através do material não deixando que conheçam a nossa verdadeira essência, por via da ostentação portanto, não nos permitirá sair do Plano em que nos encontramos e compromete severamente a nossa Evolução para além de não trazer nada de bom ao Mundo que nos rodeia. Usarmos os vícios para nos mascararmos e mostrarmos aos outros o que eles querem ver e não aquilo que somos de facto torna-nos nuns fantoches ao sabor das suas vontades quando o que deveríamos cultivar era a autenticidade tendo a capacidade de “limar as arestas” que considerarmos que necessitamos não para sermos mais belos aos olhos dos outros mas aos nossos próprios olhos e estarmos mais em sintonia com a nossa Alma e a nossa Consciência pois é a elas que devemos lealdade e não às futilidades com que somos tentados todos os dias.

Luisa Vaz

(A autora não usa o Acordo Ortográfico)

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