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Lendas e Mitos I – outras perspectivas de Evolução

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O Homem é um “animal social” por natureza. Composto por virtudes e defeitos, é muitas vezes analisado à lupa e julgado pelas suas atitudes, palavras ou tomadas de posição sem que se conheça toda a sua essência.

Não raras vezes ao descrevermos alguém fazemo-lo não dado aquilo que acrescenta à sociedade mas por qualidades ou defeitos que lhe reconhecemos de acordo com o nosso padrão de valores. E este mesmo padrão é fruto da nossa Educação, da nossa Formação e do meio onde estamos inseridos. Será que em algum momento o questionamos ou estamos dispostos a ceder em algum pressuposto que não mexa com a nossa Integridade? Até que ponto estamos dispostos a aprender e a evoluir seja com base no auto-conhecimento ou no conhecimento que adquirimos na convivência com o Outro?

Usando precisamente esse ponto como base e olhando de fora para uma sociedade que se rege por um padrão bem diferente do meu e daquilo que eu tenho como certo, optei por neste texto abordar os fundamentos básicos do Ser Humano. Não o Ser individual ou individualizado mas o Ser como parte do Universo.

E porquê seguir esta linha? Apenas porque por um lado sinto necessidade de crescer como individuo mas por outro porque acho necessário fazer uma chamada de atenção para o mais básico. Não nos podemos queixar das pessoas que nos rodeiam, com quem nos relacionamos, que nos governam ou quaisquer outros se não estivermos dispostos a fazer esta caminhada na estrada da Evolução pessoal.

Este texto tem portanto um lado algo esotérico que mais nenhum interesse tem do que fazer-nos parar para pensar um pouco nos propósitos, nas metas que traçamos e nos caminhos que escolhemos sem por vezes sermos capazes de ler os sinais ou interpretar as mensagens subliminares porque atentamos no geral e não analisamos com o devido distanciamento o particular e é aí que muitas vezes reside a lição que temos que aprender para podermos passar ao próximo estágio do processo evolutivo.

De forma a melhor ilustrar este tema, optei por recuperar os 12 Trabalhos de Hércules, publicando vários artigos com cada um deles. Fi-lo por considerar que cada Trabalho traz uma aprendizagem sobre nós mesmos e só quando nos dedicarmos a nós é que podemos esperar provocar alguma mudança ou ter a pretensão de incentivar uma melhoria no Outro e assim contribuir para um Mundo melhor e com pessoas melhor preparadas. Ligamos por vezes em demasia à matéria e ao material e esquecemo-nos que por mais que a Vida possa ser vivida com conforto, o Espírito não deve ser descurado e a maior parte das pessoas, se for preciso, não se lembra que o tem ou não tem tempo para cuidar dele. O que torna esta questão tão pertinente é que se todos cuidassem do seu este Mundo seria melhor quase que por magia uma vez que o foco das preocupações mudaria e a Comunidade tornar-se-ia num valor maior e não somente na rua e no número da porta da casa onde moramos.

Está então na hora de relembrar um pouco da história de Hércules e explanar o seu primeiro Trabalho numa perspectiva mitológica:

As provas a que Hércules se submeteu podem ser enfrentadas por milhares de indivíduos que trilham o caminho do desenvolvimento espiritual consciente.

Cada um de nós é um Hércules em embrião; os trabalhos, que ontem foram de Hércules, são de toda a Humanidade, ou pelo menos de todos aqueles que mantêm as rédeas da sua evolução em mãos, tendo em vista a iluminação espiritual.

Os trabalhos de Hércules demonstram o caminho que aguarda o aspirante espiritual sincero, aquele estágio de procura espiritual inteligente, onde, tendo desenvolvido a mente e coordenado suas habilidades mentais, emocionais e físicas, esgotou os interesses no mundo fenoménico e se procura expandir a consciência. Esse estágio sempre foi expresso pelos indivíduos mais evoluídos de todos os tempos.

Enquanto escalamos a montanha, vamos eliminando todo medo e aprendendo a controlar as forças inerentes à natureza humana, até que nos possamos tornar um servidor da Humanidade, eliminando a competição e os objectivos egoístas.

Ao aprofundarem-se os Doze Trabalhos de Hércules, torna-se claro que um dos grandes desafios é trazer, para nosso dia-a-dia, novas maneiras de expressar e vivenciar as velhas verdades contidas nestes mitos, de forma a ajudar as velhas fórmulas para o desenvolvimento espiritual a adquirirem nova e pulsante vida para nós.

Este é o desafio de sempre, actualizar a luta humana para se superar à natureza animal, fazer desabrochar a natureza humana e revelar a natureza divina oculta em cada um de nós, e que está tão bem configurado nos Trabalhos de Hércules.

Os Doze Trabalhos de Hércules oferecem um quadro sintético do progresso da alma, indo da ignorância à sabedoria, do desejo material à conquista espiritual, de tal modo que o fim possa ser visualizado a partir do início, e a cooperação inteligente com o propósito da alma substitua o esforço feito “às cegas”.

Este tema é tão rico e profundo, que todos nós, lutando em nossa actual vida moderna, podemos aplicar a nós mesmos os testes e provas, os fracassos e as conquistas desta figura heróica que lutou valorosamente para atingir a mesma meta que nós almejamos.

Através da cuidadosa e reflexiva leitura deste mito, talvez possam ser despertados na mente pela procura espiritual de novos interesses e num impulso renovado, pois diante de um tal quadro do desenvolvimento e do destino especial do Homem, ele pode querer prosseguir com redobrada coragem e determinação na Senda.

Em sua narrativa mítica, podemos acompanhar como Hércules se esforçou e desempenhou o papel de procura espiritual. Neste Caminho, ele desembaraçou-se de certas tarefas, de natureza simbólica, e viveu certos episódios e acontecimentos que retratam, em qualquer época, a natureza do treino e das realizações que caracterizam o homem que se aproxima da libertação pela senda iniciática.

O oráculo falou e suas palavras ressoam através das eras:

”Homem, conhece-te a ti mesmo.”

Neste caminho, o indivíduo submete-se a um trabalho sobre si mesmo que demanda esforço e dedicação, pureza de coração e caridade, para que a flor da alma possa desabrochar mais rapidamente.

Simbolicamente, é uma obra onde um solvente psíquico (psique = alma) consome toda escória e deixa apenas o ouro puro. É um processo de refinamento, sublimação e de transmutação, continuamente levado adiante até finalmente se alcançar o Monte da Transfiguração e da Iluminação.

Em suma, trata-se de alquimia superior. Os Doze Trabalhos demonstram exactamente este caminho acima, onde os mistérios ocultos e as forças latentes nos seres humanos são descobertos e têm de ser utilizados de maneira divina e de acordo com o divino propósito sabiamente entendido

Essa é a meta da série de Trabalhos de Hércules, e com essa meta, a Humanidade como um todo alcançará a sua conquista espiritual grupal através das múltiplas perfeições individuais.

Primeiro Trabalho – O Leão de Neméia

Na cidade de Neméia vivia no fundo de uma caverna um leão terrível, concebido por Selene uma temida feiticeira. Querendo vingar-se dos habitantes da cidade que a haviam expulsado, fez surgir esta terrível criatura. Cobrindo a pele do leão com uma poção mágica, a criatura tornou-se indestrutível, sendo incapaz de ser trespassada por qualquer arma criada pelos homens. Quando saía da caverna, devorava os habitantes de Neméia. Assim padecia a cidade com a fúria de Selene.

No Olimpo, vários heróis eram instruídos pelo centauro Quíron e, de entre eles, destacava-se Hércules, um dos filhos de Zeus. Percebendo sua bravura, lealdade e dignidade apesar de seu orgulho, Zeus resolveu iniciar Hércules nos mistérios do Olimpo, escrevendo com letras de fogo numa folha de ouro, as 12 tarefas.

O primeiro trabalho iniciático seria matar o Leão de Neméia. Indo em direcção a Neméia, Hércules tentou entender o motivo desta tarefa tão simples. Ao encontrar a caverna, Hércules entrou decidido a matar a criatura com inúmeras armas. Quando se aproximou do fundo da caverna, ele percebeu que o leão vinha lentamente na sua direcção. O Leão era enorme e fixando o olhar em Hércules, com seus olhos brilhantes e enigmáticos, Hércules foi surpreendido pelo ataque do leão travando com ele uma batalha terrível.

Hércules fugiu da caverna assustado mas resolveu retornar com suas armas, porém percebeu que elas não serviam para matar o leão. Mais uma vez ele foi surpreendido pelo ataque feroz do monstro e fugiu. Fora da caverna Hércules reflectiu sobre a tarefa e decidiu enfrentar o leão sem armas, talvez fosse essa a tarefa: usar sua razão no lugar de sua força.

Aproximando-se do fundo da caverna viu novamente o leão a aproximar-se e fixar o seu olhar em Hércules. Surpreso, Hércules viu que o brilho nos olhos do leão era um espelho que reflectia sua imagem. Ferozmente o leão avançava contra Hércules. Depois de uma longa luta, Hércules estrangulou o leão que caiu morto.

Levando seu corpo para fora da caverna, Hércules viu o tamanho real do animal, que não lhe parecia assim tão grande. Resolveu olhar mais uma vez nos seus olhos e viu que nada havia lá dentro. Ele tinha conseguido vencer-se a si mesmo e ao seu orgulho. Arrancou o pêlo do animal e fez dele uma túnica, que o tornou indestrutível. E com a cabeça fez um capacete, que passou a usar em todas as outras tarefas, para se lembrar sempre que a força nunca deveria superar a razão.

Este, tal como todos os outros Trabalhos de Hércules possui uma simbologia subjacente que é no fundo a lição que cada Ser Humano deve apreender quando o consegue realizar.

Simbologia

A luta de Héracles ou Hércules com as feras representa a constante luta que temos para conter a fera que mora dentro de nós, ao mesmo tempo que preservamos o nosso instinto vital e criativo. O leão está sempre associado à realeza e, mesmo na sua forma destrutiva, é o rei dos animais, egocêntrico e selvagem, o princípio infantil. Desta forma, sempre que o derrotamos e vestimos a pele do leão, as opiniões dos outros que antes nos intimidavam, já não têm mais valor pois estamos vestidos com uma poderosa couraça, a nossa própria identidade.

No entanto, por mais heróica que seja, a pele do leão sempre representa o egocentrismo, a dificuldade de lidar com a frustração e com a raiva contida. Não sabemos lidar com a frustração por não conseguirmos o que queremos, pela auto-importância inflamada e o orgulho desmedido. Entretanto quando dominamos essa fera que mora em nós, podemos utilizá-la de forma construtiva. As conquistas e vitórias exigem que deixemos para trás as couraças, que carregam uma alma sem paixão.

Considero que a descrição, enquadramento e explicação de cada um dos Doze Trabalhos de Hércules pode ser um exercício interessante de reflexão e aprendizagem e será portanto esta a linha que seguirei nos próximos artigos. Não deixa de ser um esforço de entendimento sócio-cultural que considero pertinente nesta época tão atribulada que atravessamos. Por vezes é necessário darmos um passo atrás para podermos dar dois em frente.

Luisa Vaz

(A autora não usa o Acordo Ortográfico)

 

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