A França elegeu o burkini como a maior ameaça atual, à segurança nacional. Existirão provas, que as mulheres que optam por tal traje balnear, estejam de algum modo ligadas ao terrorismo? Em que algibeira vai a França guardar a sua laicidade?
Sim, podemos aceitar o nervosismo francês, perante os últimos e terríveis acontecimentos. Custa-me porém aceitar que a França ceda a esta tentação medíocre e claramente discutível. Como poderemos, sociedade ocidental, depois reclamar os valores básicos e intrínsecos da nossa cultura e desbragar fervorosamente os princípios da democracia, se nos enovelarmos no paradoxo?
Depois de em 2011, o governo francês ter banido o uso do niqab e de burkas em espaços públicos (então e os chador, al-amira, hiyab, shayla e já agora, porque não [também usados por homens] as djellabas) são já sete os “mayors” – em claro posicionamento político para as eleições de 2017 – que proibiram a utilização dos burkinis, nas suas áreas de influência administrativa. Os estúrdios argumentos vão desde “não é higiénico nadar todo vestido” ou “usar burkini ameaça a ordem e tranquilidade públicas” ou ainda “ (o burkini é proibido) porque significa uma relação direta com movimentos terroristas que estão em guerra connosco”.
Em nome da diversidade, multiculturalismo e autodeterminação religiosa, outros países, como o Canadá, Espanha, Itália pronunciaram-se negativamente à proibição. Em sentido inverso, França preferiu demonstrar a atual fragilidade, de um dos mais importantes pilares da sua refundação recente: a Liberdade, considerada ameaçada pela diferença, mas também aquela que se resume às opções indumentárias das mulheres.
O bikini sofreu idêntico destino, no passado. Nos anos 50, foi proibido em Portugal, Espanha, Austrália, Itália e muitos Estados dos EUA. Sabemos, através de uma breve mirada pela História, que as conotações religiosas e sociais às várias indumentárias são isso mesmo – opiniões necessariamente dessincronizadas.
Importa relembrar que o uso do véu é anterior ao islamismo e mesmo ao cristianismo. É usado desde a Antiguidade, correspondendo, no entanto, as várias cores, a diferenças de significado. Não deixando de ser um assunto privado, é pontualmente utilizado como marca política, restritiva da liberdade fundamental das mulheres, o que evidentemente merece ser tratado com acuidade.
Incendiar a sociedade francesa com esta questão é, no entanto, absurdo e contraproducente. França promove ativamente o apartheid cultural, prova maior se atentarmos nas estigmatizadas e marginalizadas comunidades muçulmanas, algumas, apesar de tudo, povoadas por muçulmanos moderados, agora perniciosamente instigados.
Perceber que há uma diferença entre um fato de banho com capuz e uma mochila terrorista.
Deixo-vos a “vexata quaestio”: Onde cabe, nos nossos dias, a diversidade, no pressuposto Liberdade-Igualdade-Fraternidade?