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As possíveis sanções da UE a Portugal são culpa de quem?

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Em Portugal o tema das possíveis sanções a Portugal tem sido alvo de uma frenético troca de acusações, entre Governo e oposição, e palco de declarações inacreditáveis que me deixam muito preocupado e triste.

1. Já aqui deixei claro que em 2015, como é devidamente atestado pelo Conta Geral do Estado de 2015 (CGE2015) publicada no dia 1 de Julho pela Direção Geral de Orçamento, Portugal falhou a meta do défice. Em vez de um défice de 2,7%, como antevisto no OE2015 do Governo de Pedro Passos Coelho, o défice final foi de 4,4% do PIB (ou 3,1% do PIB se descontarmos as medidas pontuais e extraordinárias). Ou seja, Portugal violou o Pacto de Estabilidade e Crescimento da UE relativamente ao défice orçamental. Mas não foi só isso que violou. Como a CGE2015 deixa claro, Portugal também mostrou falhas na redução do défice estrutural (razão apresentada pelo vice-presidente da UE para sancionar Portugal e não sancionar, por exemplo, França) e não reduziu a dívida pública (falhando a meta de 123,7% do PIB prevista no OE2015, ficando o valor em 129% do PIB com um aumento de 5578 milhões de euros da dívida pública).

2. Ou seja, Portugal falhou, mais uma vez, as metas a que se comprometeu (bem definidas no OE2015 de Pedro Passos Coelho) e violou, mais uma vez, o Pacto de Estabilidade e Crescimento. Foi avisado em 2015 que o caminho não era seguro. Pedro Passos Coelho ignorou os avisos. O resultado foi este. Na verdade, Portugal não consegue um défice abaixo de 3% há mais de 40 anos.

3. Em Maio de 2016, reconhecendo o esforço feito e a resiliência dos portugueses, a Comissão Europeia adiou por 1 ano, como previsto no Pacto de Estabilidade e Crescimento (ver página 4 deste resumo), algum tipo de sanções e dando mais um ano para que esses objetivos fossem atingidos.

4. No entanto, a fazer fé em notícias e declarações dispersas de vários “responsáveis” europeus, o Governo em funções em Portugal (a denominada Geringonça) não é do agrado da maioria no poder na União Europeia. Percebo. Mas não aceito.

5. Consequentemente, os setores mais radicais continuam a colocar pressão sobre Portugal, acenando com todo o tipo de dificuldades e perigos. Schauble acenou com mais um resgate, numa atitude que considero profundamente triste e de muito baixo nível. O presidente do EuroGrupo e o vice-Presidente da CE exigem sanções. A ideia é colocar Portugal em dificuldades. Alertar para um país frágil e muito dependente do exterior para que as dificuldades aumentem: um Governo não alinhado não pode ter sucesso, parece ser a palavra e ordem. Não é muito difícil conseguir que isso aconteça. Basta fazer como fez Schauble: um discurso subtil, velhaco q.b., mostrando falsidades misturadas com verdades e dizer duas ou três palavras mágicas (por exemplo, novo bailout, não cumprir regras, etc.). O resultado pretendido por este comportamento velhaco é aumentar a desconfiança num pequeno país que não resistirá a este tipo discurso. Veja-se por exemplo Klaus Redling, diretor do Fundo de Resgate Europeu. Tem um mega problema em Itália (360 mil milhões de crédito mal parado, ao ponto de ter sido autorizado pela UE a dar garantias estatais aos seus bancos até 150 mil milhões de euros), tem outro no Deutsch Bank (5,6 milhões de milhões em risco), mas só está preocupado com Portugal. É incompreensível.

6. A ex-Ministra da Finanças do Governo anterior vem confirmar isso mesmo. Se ela fosse ministra e se o Governo anterior se mantivesse em funções as sanções não se aplicariam, afirmou ela em conferência de imprensa. Ou seja, apesar de em 2015 Portugal ter falhado todas as metas, de ter falhado redondamente todos os compromissos, as sanções não estariam em cima da mesa. Porquê? Porque a trajetória seguida era a defendida pela UE? Nem por isso, Portugal foi avisado várias vezes que as medidas não eram suficientes. Só há então uma justificação. Depreende-se das declarações da ex-Ministra da Finanças que o poder na UE gostava do Governo PàF (apesar de ele não cumprir metas), mas não gosta da solução escolhida pelos Portugueses e que tem maioria na Assembleia da República em Portugal – a UE não gosta da democracia. Consequentemente, como no passado, a ex-Ministra das Finanças pensa que a UE está, assim como esteve, disponível para fechar os olhos aos falhanços de um Governo da PàF, mas não está disponível agora com um Governo de que não gosta, nem sequer para ver se o Governo cumpre o que prometeu. Segundo ela, depreende-se, a UE vai sancionar Portugal mesmo antes do final de 2016. As verdadeiras justificações ficam para o leitor, para que pense pela sua cabeça.

7. Ontem a Reuters, reparem uma agência noticiosa, disse que a UE iria dar mais 3 semanas a Portugal e Espanha para que tomassem medidas no sentido de corrigir o défice excessivo. É exatamente isto que diz o take da Reuters. E diz mais, que há em Bruxelas uma “guerra” entre radicais e moderados e que este é o compromisso. Foi imediatamente usado pelo SPIN e por certos jornalistas ao serviço.

8. Ora, nada disto faz sentido. A execução orçamental mostra que um comportamento superior ao homólogo, isto é, Portugal está a comportar-se melhor do que fazia no mesmo período do ano passado. Das duas uma: ou a UE não acredita nos dados da Direção Geral de Orçamento, e isso é muito grave, ou então tem informações suplementares que lhe levam a concluir que o caminho que estamos a seguir é de défice excessivo. Se isso é verdade, a primeira coisa que tem de fazer é divulgar esses dados, desmentir a DGO e o Ministério das Finanças de Portugal e tornar tudo claro aos Portugueses. Não me parece que isso seja assim, pelo que se ficam pelo diz-que-diz, alimentando o SPIN de uma oposição perdida e com um comportamento anti-patriótico que é inaceitável. Ver compatriotas meus fazerem força, alinharem pelos radicais europeus, para que o nosso país, ou seja, todos nós, seja penalizado é algo de incompreensível. E muito triste.

9. Portugal teve nos últimos 30-40 anos um comportamento inaceitável. Aumentou a sua dívida, de forma contínua, para valores inaceitáveis (129% do PIB no final de 2015). Desperdiçou os mais de 125 mil milhões de euros em fundos comunitários, tornando o país ainda mais desigual, mais desequilibrado e com levadas manchas (no interior) de  desertificação económica e demográfica. Os novos fundos comunitários do PT2020 mostram de novo esse desnorte (dois anos depois do arranque o dinheiro não foi ainda aplicado em virtude de o programa ter sido muito mal montado pelo Governo anterior). Em 40 anos nunca teve um orçamento abaixo dos 3%. E isso aconteceu mesmo escondendo várias despesas pelas empresas públicas e pelas instituições públicas, estando, portanto, muita coisa escondida e fora do perímetro orçamental. Essas práticas de desorçamentação eram prática corrente de todos os Governos até há muito pouco tempo.

10. Espero que este Governo seja capaz de apresentar de forma clara o caminho que está a seguir, justificando por que razão elas permitirão cumprir metas e colocar Portugal no caminho da resolução dos seus problemas estruturais. Será dessa justeza e firmeza que resultará a convicção de que as sanções são injustas e não se devem aplicar.

Se forem aplicadas sanções a Portugal, somos todos nós que estamos em causa. As nossas escolhas, a nossa incapacidade de escrutinar e responsabilizar, e a nossa incapacidade de subir a um lugar alto, muito acima das bandeirinhas, olhar para o cenário e ser capaz de tomar decisões para o futuro.

 

 

 

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