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Uma agenda para Coimbra

 

É para mim muito desanimador ver o estado de degradação da cidade de Coimbra. Visível na falta de limpeza, na falta de cuidado, na falta de aprumo, mas essencialmente, na ausência de atividade, na ausência de iniciativa, na total ausência de estratégia económica e na capacidade de criar emprego, de estratégia cultural, educativa, em suma, de objetivos a médio e longo-prazo credíveis e partilhados pela população. Coimbra é a cidade que já quis ser tudo, mas que na verdade nunca montou uma agenda séria que permitisse concretizar tudo aquilo que quis ser. Não eram, percebemos bem, verdadeiros objetivos, os quais implicam equipas, planos detalhados, muito esforço, coordenação entre comunidades nas várias áreas e capacidade de enfrentar dificuldades. Na ausência de tudo isso, as anunciadas intenções não eram mais do que isso, intenções estéreis e inconsequentes. Muitas vezes atiradas para o ar na mira de objetivos de curto prazo, muito particulares ou pessoais, ou como justificação para gastar dinheiro de fundos comunitários. O resultado é o que está à frente dos olhos de todos. Basta querer ver.

Em 2012, quando estive na CCDRC, criei um programa, imediatamente abatido pelo centralismo de Lisboa e pela má vontade dos políticos que escolhemos, que pretendia agregar razões objetivas, e meios, para captar investimento. A ideia era responder, com factos, com razões objetivas, com ferramentas, com uma organização no terreno, à pergunta de um investidor: Tendo em conta todos os locais do mundo, por que razão devo investir em Coimbra e no Centro de Portugal? (chamava-se INVESTCENTRO) Ainda hoje não sabemos responder a essa pergunta e não nos organizamos. Tudo o resto, a operacionalização, está por fazer. No entanto, a cidade e a região tem anualmente rios de dinheiro de fundos comunitários que são canalizados para infraestruturas de que não precisamos, muito show-off inconsequente e que não resistirá nem um minuto sem fundos comunitários, muita obra sem propósito e sem capacidade de criar valor.

Quando estive no iParque, entre 2007 e 2011, um projeto que recebi sem quase nada feito, batalhei arduamente para procurar investimentos. Lembro-me, por exemplo, do investimento do Grupo Melo (Innovnano): a única fábrica de nanotecnologia que existe no país e que equivale a um investimento de 15 milhões de euros. Havia várias cidades na corrida e foram dezenas de reuniões e contactos. Ganhamos por mérito e porque tínhamos um serviço que valia a pena. Hoje, olhando para o facto de o iParque estar totalmente parado, de não se ter desenvolvido mais e não merecer a MENOR atenção da Câmara Municipal (o seu maior accionista), sinto que os estamos a enganar e que vai ser muito complicado justificar novos investimentos. As estratégias têm de ser continuadas, fazer parte do ADN da cidade. Coisas pontuais, que dependem de pessoas e da sua iniciativa individual, são isso mesmo, pontuais, e, portanto, passageiras. Coimbra desiste de tudo. Quer ser tudo e depois não é quase nada. O que há a fazer é muito duro, muito complicado e muito difícil. E só será possível fora dos partidos, que, insisto, nada de positivo têm a oferecer, e com o envolvimento da população.

É necessária uma agenda para Coimbra a 10 anos. A economia assume papel preponderante, dado o estado de degradação. Mas essa agenda não pode ser só económica, porque a economia, as empresas e a inerente capacidade de iniciativa, não são coisas isoladas. Tem de ser uma agenda com vários vetores e que tenha uma ideia central: Coimbra como cidade de OPORTUNIDADES. Tudo deve andar à volta disto. Não há empreendedores sem ciência, sem I&D e sem interface eficaz entre as instituições e a economia. A cidade não atrai, isto é, não fixa empreendedores de todas as áreas, se não desenvolver a cultura, não tiver eventos que captem o interesse, se não for efervescente. Também desmotiva se não cuidar da educação e dos mais novos: Coimbra tem de ser uma cidade que trata com prioridade a educação (de qualidade e pública). A universidade tem de fazer muito mais. Na verdade, tem de sofrer uma revolução, de cima a baixo, para que se organize, para que saia da redoma em que vive – algo desagregada da realidade da cidade e do país- , para que arregace as mangas e seja um elemento ativo de transformação. Tem de deixar de viver da sua história de 725 anos e construir, de novo, uma reputação e uma capacidade de influência que tem possibilidade de ter e que é urgente que reinvente.

Pegar nesta gente toda, definir uma agenda a 10 anos, procurar que a agenda esteja desagregada dos partidos – que nada têm a oferecer à comunidade – , de estratégias pessoais, ou de pequenos grupos, seria um passo significativo. Muito complexo, de facto, mas muito relevante. Era por aí que eu começava.

Coimbra não pode ser só importante para a contabilidade eleitoral de um líder partidário qualquer, seja ele nacional, regional ou local. Coimbra tem de ser importante porque tem algo de significativo a dar ao país, for exemplo de atitude e for merecedora. E só pode valer a pena se localmente nos organizarmos para isso, porque acreditamos nisso mesmo, nas capacidades da cidade, nas pessoas que decidiram aqui viver e na sua força diferenciadora.

 

(Publicado no Diário As Beiras de 12 de Novembro de 2016)

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